Olá amigos,
No mês passado, terminei de ler "The Sweaty Startup" do Nick Huber e fiquei com uma sensação estranha. Não era admiração pelo autor ou pelas suas conquistas. Era algo mais próximo do alívio.
Finalmente alguém tinha posto no papel aquilo que eu suspeitava há anos: a obsessão por ideias revolucionárias está a matar mais sonhos empreendedores do que a falta de capital.
Huber conta como construiu um império de 50 milhões de dólares começando por... apanhar caixas de estudantes universitários. Nada de disruptivo. Nada de tecnologia de ponta. Apenas um serviço que já existia, feito ligeiramente melhor.
E foi sobre isto que falei no episódio desta semana do Manual de Boas Ideias. Porque enquanto toda a gente sonha com a próxima Uber, há milhares de pessoas a enriquecer com negócios que os nossos pais reconheceriam perfeitamente.
A mentira que nos venderam
Vivemos numa era em que "empreendedorismo" se tornou sinónimo de "inovação disruptiva". Shark Tank, Dragons' Den, TechCrunch - tudo gira à volta da próxima grande ideia que vai "mudar o mundo".
Só que... a maioria das pessoas ricas que conheces não mudou o mundo. Pegaram num negócio chato e fizeram-no funcionar melhor.
O vosso vizinho que tem três carros na garagem? Provavelmente tem uma empresa de limpeza industrial. A senhora que vêem no clube de ténis? Deve ter herdado uma oficina mecânica e transformou-a numa cadeia de reparação auto. O tipo que joga golfe às terças-feiras? Compra e vende contentores de lixo.
Negócios chatos. Lucros interessantes.
Por que é que "chato" é bom
Huber tem uma teoria simples: quanto menos divertido for um negócio, mais dinheiro há para ganhar. Porquê?
Menos competição. Ninguém sonha em ser o rei dos aspiradores industriais. Toda a gente quer ser o próximo Elon Musk.
Menos ego. Quando não há glamour, as decisões são puramente racionais. Funciona? Dá dinheiro? Então fazemos.
Mais foco. Sem a pressão de "mudar o mundo", podem concentrar-se no que interessa: servir bem os clientes e cobrar adequadamente por isso.
5 negócios chatos (mas lucrativos)
Baseando-me no livro e na minha própria observação do mercado português, aqui estão cinco exemplos que me chamaram a atenção:
1. Limpeza de escritórios
Racional: Todas as empresas precisam. Poucos querem fazer. A maioria dos concorrentes são desorganizados.
O segredo: Sistemas, uniformes, software de gestão simples. Parecer mais profissional que a concorrência não é difícil.
2. Manutenção de jardins para condomínios
Racional: Mercado previsível, contratos anuais, trabalho repetitivo que se pode sistematizar.
O segredo: Enquanto outros fazem jardins de luxo (competitivo), vocês podem fazer manutenção básica em escala.
3. Reparação de eletrodomésticos ao domicílio
Racional: As pessoas odeiam sair de casa para resolver problemas. Pagarão extra pela conveniência.
O segredo: Agendamento online, peças em stock, diagnóstico rápido. Eficiência operacional.
4. Gestão de propriedades para Airbnb
Racional: Proprietários querem o rendimento, não o trabalho. Vocês fazem a ponte.
O segredo: Automatização das comunicações, equipas de limpeza próprias, preços dinâmicos.
5. Recolha e reciclagem de eletrónicos
Racional: Regulamentação obriga empresas a descartar adequadamente. Poucos sabem como.
O segredo: Certificações, parcerias com empresas, revenda de componentes valiosos.
A fórmula que funciona
Huber resume tudo numa fórmula simples:
Problema comum + Solução chata + Execução superior = Dinheiro
Não precisam de inventar nada. Precisam de fazer melhor aquilo que já existe. Responder ao telefone. Chegar a horas. Fazer o que prometeram. Cobrar adequadamente.
Parece básico? É. E é exatamente por isso que funciona.
O que aprendi (e partilhei no podcast)
No episódio desta semana do Manual de Boas Ideias, aprofundei três lições que retirei do livro:
- A inovação está na execução, não na ideia. Peguem num negócio que funciona e façam-no 10% melhor em três áreas: velocidade, qualidade, preço.
- Comecem local, pensem local. Esqueçam a escalabilidade global. Dominem primeiro a vossa cidade.
- Contratem cedo, deleguem rápido. O objetivo não é fazer tudo sozinho para sempre. É construir sistemas que funcionem sem vcoês.
A pergunta que devem fazer
Em vez de "Que ideia revolucionária posso ter?", perguntem-se:
"Que serviço chato, mas necessário, posso fazer melhor que a concorrência na minha área?"
A resposta pode não ser sexy. Mas pode ser lucrativa.
E no final do dia, preferem ter uma ideia sexy que não funciona ou um negócio chato que vos dá liberdade?
Até à próxima Nata,
Diogo
P.S. Se este tema vos interessou, ouçam o episódio completo no Manual de Boas Ideias. Falamos sobre mais exemplos práticos e como avaliar oportunidades na vossa área.